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Biojoias e recomeço

A arte de eternizar memórias em resina

Tia e sobrinha transformaram a luta contra a ansiedade e a depressão em uma marca de biojoias com identidade

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Fátima Ferreira e Giselly enfrentaram a depressão e a ansiedade fazendo arte em resina
Fátima Ferreira e Giselly enfrentaram a depressão e a ansiedade fazendo arte em resina | Foto: Ailton Cruz

Por trás do negócio de artesanato sustentável revela-se uma história de recomeço. O Carpe Diem Do Biojoias nasceu da parceria entre tia e sobrinha, Fátima Ferreira e Giselly, como forma de enfrentar a ansiedade e a depressão. Com um estilo inconfundível, as biojoias combinam memória, afeto e o amor pela natureza que une as duas. Feitas com flores, folhas e resina, cada peça é única e carrega uma história.

O trabalho manual virou uma necessidade, era a única forma de tirar Fátima da cama, que passava por uma forte crise depressiva após a morte do pai. Ela conheceu a arte com a resina nas redes sociais, achou curioso e quis aprender. O que dava forças para sair da cama era justamente acertar o ponto da resina, que demora horas para secar.

“Nessa pesquisa, eu comecei a fazer resina em casa, comecei a comprar resina de péssima qualidade e tentava fazer de tudo para poder sair da cama. Por causa do cheiro forte, não podia ficar no quarto, o que me obrigava a sair da cama todo dia para poder ver se tinha dado certo”, revela Fátima.

Do outro lado, a sobrinha dela, Giselly, que morava em Pernambuco e queria ter novas experiências e conhecer um lugar diferente decidiu morar um tempo com a tia em Maceió. Chegando em 2021, deparou-se com Fátima muito abalada. “A tia que me mandava áudio brincando duas semanas antes da minha chegada a Maceió, passava o dia na cama”, conta.

Giselly também estava lidando com a ansiedade, e sentia que ambas precisavam sair de casa e conhecer pessoas novas para superar essa fase difícil. Sem saber como ajudar a sobrinha, Fátima se perguntava o que poderia fazer. Ao olhar ao redor e ver os experimentos de resina espalhados pela casa, Giselly encontrou a resposta. “Vamos vender isso aqui”, relembra.

Giselly deu o primeiro passo ao sair pela vizinhança para vender as peças
Giselly deu o primeiro passo ao sair pela vizinhança para vender as peças | Foto: Ailton Cruz

Ela conta que, momentos depois, quase como uma resposta divina, uma vendedora de queijo bateu à porta da casa delas, e Giselly decidiu oferecer as peças pela vizinhança, mesmo contra a vontade de Fátima, que tinha vergonha das próprias criações. Para a sobrinha, vender era um meio de aliviar os sintomas da ansiedade.

A primeira venda foi memorável e crucial para o negócio se erguer. Elas lembram com carinho da cliente que comprou um chaveiro - que, segundo a dupla, não era tão bonito - e ainda encomendou outro para presentear o filho. “Se não fosse aquela pessoa, eu acho que a Carpe Diem Do seria, até hoje, só um escape, só uma brincadeira, uma maneira de deixar a vida um pouco mais leve”, conta Fátima

Ainda envergonhada, mas agora estimulada pela venda, Fátima procurou aprimorar mais as suas habilidades. Pesquisou e estudou sobre o método: estava determinada a fazer peças cada vez mais bonitas.

O trabalho com as flores começou depois. Inserir a flor na resina exige técnica, pois a flor antes precisa ser desidratada por alguns dias. Fátima explica que a parte mais desafiadora é manter a cor original das flores após o contato com a resina. Aos poucos, ela se tornou experiente na técnica, passando a produzir peças mais elaboradas.

No entanto, a relação com a natureza e com a “parte mística da vida” é herança da família. Giselly conta que o jardim era o principal cenário em que aconteciam a maioria dos momentos especiais em família e conversas profundas que ficaram na memória. “Na maioria das minhas fotos de infância eu estou em alguma árvore pendurada ou aguando as plantas com minha vó”, diz.

Como verdadeiras amantes das flores, elas conhecem a floriografia - a simbologia das flores -, e, para deixar as criações ainda mais especiais, fazem composições com flores de diferentes significados. “Por exemplo, a violeta, é a flor do mistério, e a vida sem mistério é uma chatice. Mas o mistério também sem controle é uma bagunça. Então, sempre que a gente vai trabalhar com violeta, juntamos com o cosmo, que é a flor da harmonia", explica.

Tia e sobrinha transformaram a arte em resina em recomeço
Tia e sobrinha transformaram a arte em resina em recomeço | Foto: Ailton Cruz

As flores usadas nas biojoias são cultivadas por elas mesmas no quintal de casa, levando em consideração as particularidades de cada planta e respeitando as floradas. Também contam com uma estufa para desidratação das flores. Artesãs sustentáveis e com consciência ambiental, utilizam produtos de marcas responsáveis que promovem o reflorestamento. Além disso, oferecem consertos das peças para evitar o descarte desnecessário.

Enquanto Fátima é a responsável pelo design das peças, Giselly comenta que o seu papel é “dar pitaco” e ser o “menino”. “Eu falo sempre nos atendimentos em feiras e eventos que eu sou o menino. Como assim o menino? Ô menino vai regar as plantas! Ô menino pega aquilo! Ô menino cadê a tesoura?”, responde brincando.

As inspirações de Fátima podem surgir de qualquer lugar: suas vivências e memórias familiares, filmes, desenhos, e das próprias flores e folhas. Ela imagina peças que as pessoas que ama gostariam de usar. Mas o que mais a motiva é o brilho nos olhos das clientes ao recebê- las.

ORIGINAIS E ÚNICAS

A unicidade é com certeza a característica mais marcante do Carpe Diem Do. Fátima conta que em quatro anos de negócio nunca fez uma peça igual a outra, todas apresentam um diferencial.

As possibilidades de criação com resina são amplas. Fátima não se limita apenas aos acessórios. No catálogo tem xícaras, pentes, porta-jóias e os clientes podem também fazer pedidos personalizados. Para elas, nada é um desafio quando se tem criatividade e determinação.

Tia e sobrinha trabalham também com as eternizações, que é a arte de preservar objetos de memória em resina, como buquês, cabelo, dentes de leite e cinzas. Momentos que não merecem ficar esquecidos no fundo do armário. Contam que, além de capturar lembranças especiais, o Carpe Diem Do oferece outra maneira de dizer “eu te amo”.

“Nós eternizamos o buquê de um casal que se conheceu numa cafeteria como duas xícaras de café, para que se lembrassem todos os dias do motivo que os uniu. Também para que recordem o momento em que disseram ‘sim’ todo dia na hora do café. A gente acredita que o ‘eu te amo’ nem sempre precisa ser verbalizado, porque nem sempre conseguimos dizer, mas o mais importante é mostrar”, revela Giselly.

Tia e sobrinha exibem peças produzidas com resina
Tia e sobrinha exibem peças produzidas com resina | Foto: Ailton Cruz

A dupla não mede esforços para aperfeiçoar o lado artístico. Atualmente, elas fazem o curso técnico em artesanato no Instituto Federal de Alagoas, e sempre que possível participam de oficinas e capacitações para aflorar a criatividade e explorar novas possibilidades.

A escolha do nome da marca não foi por acaso, carrega um significado muito forte marcado por perdas, aprendizados e ressignificados. Carpe Diem significa aproveite o dia em latim, e é uma frase que Fátima leva consigo desde a adolescência. Após a morte da mãe e do irmão, ela percebeu que não aproveitou tanto a presença deles quando teve a chance. A partir disso, se dedicou a passar mais tempo de qualidade com seus familiares.

“Carpe Diem é aquele que aproveita o momento, aproveita o dia. O que eu não fiz com a minha mãe, nem com o meu irmão mais novo, fiz com o restante da família. E assim, aprendi a viver o aqui e agora de uma forma tão intensa, tão verdadeira, sem interferências, aprendi verdadeiramente a conhecer o ser humano. Então, por isso o nome da empresa”, expõe Fátima.

Passando por diversas profissões, ambas aprenderam a extrair os pontos positivos de cada experiência, o que inspirou Giselly a acrescentar o verbo auxiliar em inglês “Do”. A escolha reforça o conceito de aproveitar o dia respeitando suas singularidades e limites, viver o dia à sua maneira.

A Carpe Diem Do não é para aqueles que se importam apenas com estética, mas para quem valoriza os significados e gostaria de guardar até os pequenos detalhes dos melhores momentos da vida. “Não queremos que as pessoas saiam de lá apenas com um colar ou um brinco. Queremos que saiam com um momento, um desejo. A Carpe Diem Do é um poema no dia a dia", finaliza a dupla.

Para quem quiser conhecer o trabalho delas, basta acessar o Instagram @carpediem_do.fg. Por lá, também podem ser feitas encomendas.

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