Impasse
Demarcação de terras indígenas gera impasse em Palmeira dos Índios
De um lado, estão agricultores; do outro, a comunidade Xukuru-Kariri, que espera reconhecimento de suas áreas

Repórter

O processo de demarcação física de terras indígenas tem sido motivo de dor de cabeça para muitos agricultores do município de Palmeira dos Índios, no Agreste de Alagoas. São centenas de famílias que podem perder o direito sobre as propriedades que ocupam atualmente. Por outro lado, os indígenas da comunidade Xukuru-Kariri reivindicam seus espaços há várias décadas.
Dos 7 mil hectares de terra que cabem a eles, conforme delimitação feita pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), apenas 1.500 estão sendo devidamente ocupados por essa comunidade. Agora, na busca de que a justiça seja feita, eles batalham para usufruir das terras indígenas (TI) que, por direito, seria deles.
Na última semana, uma equipe da Funai, acompanhada da Polícia Militar de Alagoas (PMAL), esteve nas propriedades dos agricultores para fazer um levantamento da área, deixando os moradores, que sobrevivem há vários anos do que plantam e colhem, assustados. Sem compreender muito o que está acontecendo, eles alegam que sempre estiveram ali, desde o tempo de seus bisavós, e se mostram dispostos a lutar pelo que acreditam ser deles.
Samuel Ricardo da Silva é um desses agricultores. Ele lembra que mora no local desde criança e alega possuir o documento do terreno. “Isso aqui nunca foi terra de indígena. Essa terra é nossa, compramos com o dinheiro do nosso suor. Estou aqui desde criança. Temos escritura, pagamos impostos e está tudo registrado em cartório. Nós somos daqui, eles não”, afirma o morador da localidade conhecida como Serra do Candará.
As terras em questão, segundo autoridades, representam cerca de um terço de toda a área rural produtiva de Palmeira dos Índios. Uma audiência pública realizada este mês na Câmara de Vereadores da cidade reuniu agricultores, representantes indígenas e autoridades para debater o processo de demarcação de terras.
De acordo com o presidente da Câmara Municipal, vereador Madson Monteiro, como resultado da audiência pública foi criado o Fórum Permanente de Resistência à Demarcação, que tem o objetivo de articular ações coletivas e dar voz às comunidades impactadas. “A Câmara acompanha o andamento do fórum e avalia medidas que respeitem a legislação e busquem equilíbrio entre as partes”, afirmou o parlamentar.
LEVANTAMENTO
Conforme informações divulgadas neste ano pelo Conselho Indigenista Missionário, são cerca de 460 ocupantes não indígenas instalados em mais da metade da TI, conforme o último levantamento fundiário da Funai.
Segundo o Conselho, as visitas realizadas pelo órgão indigenista às propriedades têm como finalidade entender qual o perfil desses ocupantes para encaminhamento de indenizações e reassentamento, no caso dos pequenos produtores, conforme a legislação brasileira.
A expectativa dos Xukuru-Kariris é pela homologação, por parte do governo federal, das terras pertencentes a eles em Palmeira dos Índios. Enquanto isso não acontece, os indígenas reclamam que têm enfrentado a hostilidade da população e a difusão de informações mentirosas, que têm dificultado ainda mais todo o processo.
Em setembro, a equipe da Funai chegou a receber ameaças quando realizava o cadastramento das ocupações e o levantamento de benfeitorias feitas por não indígenas na área. De acordo com informações divulgadas pela Advocacia Geral da União (AGU), esse trabalho é uma das etapas do cumprimento de sentença em ação civil pública que determinou a conclusão da demarcação das terras. A conclusão das avaliações de benfeitorias precede a desintrusão da área e a concessão da posse definitiva aos indígenas.
Ainda conforme informações divulgadas pela AGU, também circularam mensagens de incitação à violência contra a Funai em grupo de WhatsApp de agricultores. A equipe precisou recorrer à justiça para contar com a companhia de policiais.
Da parte dos agricultores, a resistência e o medo de perder as terras é algo real. “Faz tempo que vivemos aqui. Isso nunca foi terra indígena e agora a gente fica sem ação. Estamos sem saber o que fazer”, afirma um deles.