O que tem nesse Brigadeiro?
DJ Brigadeiro: o som, a festa e a reinvenção da noite no Jaraguá
Ele se tornou um dos protagonistas da vida noturna de Maceió, com aposta em nostalgia e performance


Na crônica noturna do Jaraguá, bairro histórico de Maceió, a juventude renova memórias e dá novos significados para aqueles prédios, becos e corredores enfeitados pelo passado e por paralelepípedos elegantes. Espaço de encontros, resistências e, claro, dança, diversão e boemia, um novo Jaraguá se ergue, deixa de ser vestígio afetivo para pulsar novamente como um dos principais polos da vida noturna da cidade. No centro desse movimento, entre pistas que fervem e gente colorida, está o DJ Brigadeiro, um dos agitadores culturais que ajudam a redefinir a experiência da noite alagoana.
Brigadeiro é o pseudônimo do maceioense Fillipe Beltrão Lyra, publicitário por formação e DJ por vocação. O apelido que remonta à infância e carregava nuances de bullying, tornou-se identidade. “Hoje, quem me chama pelo meu nome, rola um estranhamento... é capaz de alguém chamar e eu sequer olhar, desacostumado”, conta.

O amor pela música o acompanha desde a infância. “É só perguntar para alguém da minha família. Eles claramente têm alguma história pra contar. Sempre amei música, coleciono até hoje CD’s, DVD’s e vinis. É uma paixão forte”, diz Brigadeiro. Conforme a era dos streamings ia crescendo, o alagoano começou a colecionar outra coisa: as playlists que criava.
“Ali por 2013, 2014, eu usava muito as redes sociais para comentar músicas, o que achava ou deixava de achar — dentro do meu gosto musical — e, às vezes, disponibilizava links de playlists pra quem quisesse ouvir e salvar. Sempre fui geek pra música, então criava as playlists com temas específicos, criava uma ordem superlegal e harmônica para as faixas”, relembra.

Em 2014, um amigo viu potencial nessa paixão e o convidou para tocar em uma festa. Era apenas o início do caminho que, entre a publicidade e a direção de arte, levaria Brigadeiro à decisão definitiva: deixar o mercado formal e investir na carreira artística. “Em 2023, decidi largar minha profissão e seguir como DJ. E até aqui, segue sendo minha prioridade”.
Na cena noturna do Jaraguá, ele se tornou um dos principais nomes de um movimento que vai muito além da música: é também sobre pertencimento, comunidade e ocupação de espaços urbanos. “O Jaraguá é um dos polos principais da vida noturna em Maceió, e eu sou muito feliz em fazer parte dessa fatia por tanto tempo”. O bairro, com suas festas temáticas, diversidade de sons e um público cada vez mais envolvido, também se tornou espaço para que a cena LGBTQIAPN+ se expandisse e florescesse com segurança. “Boa parte dos produtores de eventos que fazem o fervo do Jaraguá acontecer são pessoas da comunidade, fazendo eventos para a comunidade e para o público em geral. Isso é gratificante”.
Seu repertório é uma viagem no tempo. Flutua entre o pop nacional e internacional dos anos 1980, 1990 e 2000, passeia pelo funk e dialoga com rock, axé, pagode e samba. “O que mais escuto (e que me deixa muito feliz) é: ‘Briga, fiquei sem acreditar que você tocou tal música naquela festa... é raro alguém tocar e você tocou. Dancei tanto, nossa, fiquei muito feliz!’”, afirma. A assinatura do Brigadeiro está na escolha não óbvia das músicas e na capacidade de despertar nostalgia e descoberta.
DIA MUNDIAL DO DJ
Neste domingo, 9 de março, é celebrado o Dia Mundial do DJ. Brigadeiro aproveita para lembrar que o trabalho desse artista, por sua vez, vai além da seleção musical. Ele também revela alguns dos segredos que fazem seu nome circular entre uma party e outra. Há um cálculo invisível, um controle do ritmo da noite, um jogo de interação com o público.
"Eu sempre me proponho a levar para as festas músicas que boa parte do público vão conhecer, e uma parcela de músicas que talvez o público não conheça, mas que são tão boas que fazem o público se mexer. Até porque, nós DJ's também educamos o público de alguma forma. Somos, de fato, o coração do evento. Costumo brincar, falando com um de meus parceiros de trabalho e grande amigo DJ FJSAN, que meu forte está em fazer escolhas 'não tão óbvias'. Acredito que esse é um diferencial meu", revela Brigadeiro, que continua.
"Fora o interagir com o público, que eu amo! Eu danço, faço coreografias quando sei, olho nos olhos das pessoas, aponto, tiro foto. Porque ser DJ é isso, vai muito além de apenas tocar, esperar a música acabar e tocar outra. Isso faz com que o seu trabalho seja único, ousado de alguma forma e faz com que as pessoas voltem em uma próxima oportunidade."
O entusiasmo do público por suas performances se reflete também na sua própria forma de enxergar o papel do DJ. “O DJ é a alma e o coração de qualquer evento. É quem move o cenário noturno local e Brasil afora. É ele que te faz sentir muitas emoções em poucos minutos. É ele que tem a maior leitura do evento: se o público está gostando ou não do que está sendo tocado. É ele que te faz sentir que teve a melhor noite da sua vida”.
E a vida noturna, para ele, não é só sobre entretenimento. “Eu ia para os eventos para ser na noite o que sou, de forma escondida. Hoje, não mais. E eu acredito que existem vários Brigadeiros que saem na noite pra ter esse momento de respiro, de ser de fato quem a gente é – já que, no dia a dia, por diversos fatores e principalmente pelo medo, acabam deixando nossos sentimentos e o viver a vida mais retraídos”.
Para ele, há um sentido de comunidade e identificação no espaço da noite, onde música, política, moda e cultura se entrelaçam. E para quem deseja ingressar na carreira de DJ em Alagoas, ele tem um conselho: “Seja você o tempo todo. Muitos vão ter opiniões sobre o seu trabalho sem te perguntar se você quer ouvir, mas, no fim, só quem vai saber o que é melhor para você, é você mesmo”. O erro, segundo ele, é parte do caminho. “Você só vai entender se está pronto ou no que pode melhorar passando pela experiência do erro. É algo que até hoje acontece comigo. E hoje, quando erro, penso: ‘ótimo, já sei o que não fazer no meu próximo DJ set’”.