MODA SUSTENTÁVEL
O novo velho
Consumo consciente e economia faz com que bazares e brechós atraiam cada vez mais públicos em Alagoas


A moda é cíclica. Peças icônicas sempre ressurgem nas passarelas e mais tarde nos guarda-roupas. No entanto, as roupas não têm prazo de validade. A normalização do consumismo faz com que as pessoas confundam estar na moda com usar roupas novas e com preços exorbitantes. Já a responsabilidade ambiental nunca deve sair de moda, e os brechós, além de acessíveis, são uma alternativa consciente ao ritmo acelerado de consumo de vestuário que polui severamente o meio ambiente.
Garimpar, em seu sentido tradicional, refere-se ao trabalho dos extratores de pedras preciosas no solo, mas ultimamente, a palavra voltou a circular fora e dentro da internet em um novo contexto: como uma das principais vantagens dos brechós, que é a possibilidade de encontrar um artigo vintage por valor muito baixo. Os garimpeiros são agora os exploradores que estão à procura de peças raras.
Nas redes sociais, os conteúdos dos garimpeiros chamam a atenção dos interessados por moda. A produção desses tipos de conteúdo foi um motor para aumentar a procura por brechós e peças de segunda mão, principalmente para a geração mais jovem.
O interesse por brechós da estudante de química Camila Freitas, 20 anos, começou ainda na infância, quando visitava brechós e bazares beneficentes com os pais. Quando uma das influencers que acompanhava no TikTok começou a postar vídeos sobre o tema, percebeu que também podia criar conteúdo com algo que gostava e tinha familiaridade.

Estilo vai além de vestir o que está nas vitrines. Fugir da mesmice é uma mensagem que reforça personalidade própria, e os brechós, sem dúvida, possibilitam escolhas únicas. “As roupas de brechó têm texturas diferentes quando comparadas às Fast Fashions. Então eu gosto bastante de brechós tanto por serem sustentáveis quanto das texturas das roupas mais antigas. Eu gosto bastante de garimpar, principalmente, vestidos dos anos 90, do corte, das textura dos bordados, do cuidado das roupas de antigamente”, revela Camila.
Assim que começou a postar conteúdo voltado a brechós de Maceió, os vídeos de Camila no TikTok (@camiz.benevides) mostrando seus achados - como uma bolsa da Carolina Herrera que garimpou por apenas um real - e dicas de lugares, conquistou o público, que sempre pede por mais.
O TikTok foi uma ferramenta certeira para quebrar o preconceito contra o reuso de roupas. Com esse novo olhar, muitos passaram a frequentar os brechós, formando uma nova comunidade de garimpeiros. “Um menino que eu conheci recentemente e que me segue no TikTok estava falando que não sabia que em brechós havia roupas tão legais. Ele achava que só tinha roupa de velho. E eu fiquei pensando nisso e muito feliz de saber que eu posso quebrar algum estigma e mostrar o quão a moda pode ser sustentável”, comenta Camila.
Apaixonada por peças vintage, Ana Caroline Sátiro, dona e curadora do brechó online Maria Farinha (@mafa.brecho), já fazia compras em brechós. No entanto, a ideia de criar seu próprio negócio surgiu quando procurava conciliar o trabalho com a maternidade.

O nome escolhido exprime muito bem o cenário maceioense. Enquanto passeava com uma amiga na praia e contava sobre os planos de abrir seu brechó, um caranguejo do tipo Maria Farinha saiu da areia como uma resposta. Nada mais nordestino do que “Maria” e “farinha”.
“Todo mundo merece se vestir bem”. Esse é o propósito social do Brechó Maria Farinha. É promover a venda de roupas de boa qualidade com um valor acessível para a maioria da população. “Com o passar do tempo, fui prestando mais atenção em algumas questões sociais, percebi que as pessoas periféricas se vestem muito mal. Não esteticamente falando, mas falando em conforto, qualidade. O que mais se vê nos bairros mais pobres são essas lojas de R$ 20, onde a maioria das peças é confeccionada em poliéster e tem péssima qualidade. É muito comum que, em datas festivas, essas pessoas comprem roupas com valores que fogem do seu orçamento”, destaca Ana.

BRECHÓ COM LUXO
A consultora de imagem e estilo Tatiana Alvim é a responsável por inaugurar um Brechó Boutique em Maceió, espaço com peças de marca e com uma seleção cuidadosa.
Como consultora de moda, ela fazia closet detox para separar peças que suas clientes não usavam mais. Sem um destino específico para essas roupas de alta qualidade, decidiu abrir o Luxo no Cabide em 2018, combinando consumo consciente e estilo.
No começo, fazia duas edições ao ano com uma loja física temporária, que ficava aberta por 15 dias. Hoje, o Luxo no Cabide funciona como uma loja online no Instagram (@luxonocabidebrecho).
Para ela, o movimento dos brechós chega para diminuir os impactos da indústria do vestuário no meio ambiente. “O conceito ou propósito por trás do brechó é justamente trazer uma moda mais acessível e tornar o consumo mais sustentável, porque a indústria da moda é uma das mais poluentes do mundo. Então, quando a gente vê aquelas montanhas de lixos, de roupas, de fast fashion, é, realmente de assustar. E o planeta não vai aguentar mais tanta roupa, tanto consumo e tanto descarte de roupas. Então o propósito é fazer essa moda circular, tornar mais acessível e ajudar o planeta”, afirma.

Já o brechó online Florescer não se limita à venda de peças garimpadas. A loja promove trabalhos de upcycling, oferecendo um diferencial com reformas e personalizações que incluem a transformação de calças em saias, além de bordados e recortes criativos.
Os idealizadores Clara Loyse e Max Coting viam de perto a magia do reaproveitamento de roupas. Para eles, é muito significativo utilizar uma peça que pertencia a alguém com o mesmo estilo, além de possibilitar a descoberta de novas pessoas e tendências a baixo custo. Assim, perceberam que ao entrar nesse mercado, poderiam valorizar a moda sustentável, quebrar o preconceito e germinar esse sentimento em mais guarda-roupas.
Nos últimos tempos, a gente tem visto pessoas cada vez mais à vontade para comprar roupas em brechós, o que quebra um pouquinho o preconceito que algumas delas têm de que são roupas velhas, roupas que não tem como usar. Mas sabemos que tem muitas roupas que estão em ótimo estado e que vão completar um guarda-roupa com o estilo de cada um”, reforça Clara.
Os brechós também mudaram o modo de consumo de Laila Costa, proprietária do Bergamota Brechó (@bergamotabrechómaceio). Ela entrou nesse universo em 2017 e, desde então, passou de uma pessoa consumista para uma ativista na causa ambiental. Laila reflete: “Trabalhar com roupas de segunda mão me fez repensar o consumo e valorizar o que já existe. Também há algo muito bonito em dar um novo sentido às peças; cada roupa tem uma história, e ver ela ganhando uma nova dona é especial”.
Com uma curadoria zelosa e focada na moda contemporânea, o brechó está localizado no bairro da Ponta Verde, em Maceió. Laila valoriza, sobretudo, a experiência dos clientes, deixando-os à vontade para escolher as roupas como se estivessem em um closet compartilhado. Para ela, moda também é cuidado.
